Monólogo by Guillermine Carvalho

em

“Vida, louca vida, vida breve já que eu não quero te levar, quero que você me leve”

Cazuza

Tenho raiva de tudo! Do tudo e do nada. Do tudo, do nada, do tudo! Tenho raiva de ambos pois penso de mais. Paro, penso, analiso. Estou sozinho, sentado numa cadeira, uma mesa à frente e em cima desta, uma garrafa de coca-cola. Ela me chama. Escuto seus gemidos e sussurros: “Venha, beba-me! Consuma-me, saboreie-me…” — cada vez mais forte — “VENHA, EU ORDENO, EXPERIMENTE-ME, vou lhe proporcionar uma experiência muito agradável, uma sensação de frescor e alívio.” Não! Não irei entregar-me ao capitalismo que você representa de forma gigantesca. Não beberei este veneno, com isto não saciarei minha sede! Um xarope transformado em produto de consumo de massas. Inaceitável, algo que foi produzido para ser um remédio e consumido como um simples refresco.

O quê é que estou pensando? O refrigerante fala comigo? Estou ficando louco, insano, demente! Acho… não sei… penso demais. Eu tento parar de pensar, mais não consigo. Eu tento, não consigo, eu tento, não consigo. Acho que o problema é este. Eu penso em como parar de pensar, o certo o simplesmente parar. Assim… agora eu consigo. … HAAAAAAAA!!!!!!!!!!! Eu não consigo! Será que a loucura chegou? Meu Deus. Deus? Será que Deus existe? Não sei, a verdade é que nunca acreditei nele.

Às vezes penso que tudo é só imaginação minha. Que tudo é um sonho. Essa divagação é engraçada. De quando em vez converso com alguém fútil e este, querendo ser intelectual e seguindo minha linha de raciocínio, diz que sempre pensou nisso, que ele pensa que de repente pode acordar. É por isso que é engraçado, eu penso com tanta profundidade em certos assuntos e pessoas tão merda vêm com essa. Duvido que elas realmente tenham pensado assim. Algo parecido com o que eu sinto pode lhes ter passado pela cabeça. Mas pensar como eu, não.

Só existe o meu pensamento. Vocês são frutos da minha imaginação, assim como eu sou produto de suas mentes. Credo! Isso é estranho demais, a inexistência, o nada. A existência, o tudo. Bateu um vazio dentro de mim agora que me preencheu, uma insignificância. Estou com medo, medo de estar ficando louco, depressivo, psicótico, não sei. Paranóico talvez. Talvez tudo e talvez nada, ao mesmo tempo. No mesmo lugar, em mim. É disso que tenho raiva, do tudo e do nada. Tudo, nada. Nada, tudo. Tudo, nada. Nada, tudo. O nada não existe e o tudo é tão grande que não merece relevância, ou senão, toda a relevância.

Não sei mais o que eu penso. Que saco, só penso. Não paro de pensar. Eu tento, não paro. Eu tento, não paro. Já estou por aqui com a minha cabeça. Realmente por aqui. Acho que se existisse uma maneira fácil, rápida e indolor de morrer, já teria tentado. Mas não sei… tenho medo. Pelo meu medo, sinto amor e ódio ao mesmo tempo. Amo o meu medo e odeio o meu medo, no mesmo lugar. Um medo bobo, estúpido, idiota, medíocre. Assim como eu, acho que por isso o tenho.

Já pensou se eu falasse tudo o que eu penso? Como seria? Vocês iriam entender alguma coisa, eu ia entender alguma coisa? Com certeza iriam dizer que eu era louco. Logo depois seria um crime. Ai que situação difícil. Não tenho coragem de nada. Tenho timidez de tudo, não consigo me expressar direito. Não consigo me expressar, tenho tanto a dizer, mas não sei por onde começo. Acho que o meu carma entrou em coma. Tenho sentido isso ultimamente. Acho que ando vivendo e renascendo na mesma forma, na mesma pessoa. Tudo começou quando eu fiz uma regressão e só me lembrava de situações que vivi nesta vida. Nunca fui ao menos uma formiga. Sempre do mesmo jeito. Nem melhora, nem piora. Acho que por isso não me matei ainda. Nascer da mesma forma de novo! Meu carma entrou em coma, será possível isso? Meu carma está em coma! Num leito frio em uma UTI e o pior é que ele não tem plano de saúde, vai ficar lá até ser mandado embora por falta de pagamento. Eu sinto. Enquanto isso fico aqui morrendo e nascendo na mesma forma.

Sinto uma dor profunda. É minha alma. Ela está se desprendendo do meu corpo. Lá está ela, lá no céu, numa aurora boreal. Lá está ela se divertindo com anjos, borboletas, vaga-lumes, pirilampos, duendes, fadas e gnomos, numa dança frenética. Por que ela fica ali em cima? Vem logo aqui e fica quieta. Agora entendo, ela está me dando um recado. Me falta um caráter mais humano. Sou uma máquina, um autômato, um simples robô. Que funciona de acordo com um ciclo depressivo, depressivo, depressivo… um moto perpétuo melancólico. Isso está errado. O meu carma era para ser um moto perpétuo, assim como o de todos. Mas ele parou, entrou em coma, não funciona mais e para piorar, minha alma saiu de mim, se cansou.

O que eu faço? Se recorro a Deus me sinto hipócrita. No Diabo acredito menos ainda. Penso em Kardec, Alá, Buda. Um dia, num sonho, vi Buda e perguntei: ‘por que penso tanto?’; ele olhou calmamente para mim e disse: “Tudo é dor”. Tudo é dor? Por que ele foi falar isso? Por que ele não disse que eu penso porque as abelhas zumbem. Sei lá, algo assim. Mas, tudo é dor? Se bem que faz sentido. Vivo sentido dores, angústias, depressões…

Sentado aqui eu vejo várias coisas. Uma janela, um poste, um pinheiro, uma roseira, prédios. Vejo muitas coisas. A maioria é inútil, como tudo e como nada. A mesma importância, o mesmo significado. Então nada importa. A luz de agora é estranha ela me toca e sinto coisas diferentes, uma pequena sensação de solidão prazerosa. Sinto vontade de chorar, mas não consigo tirar uma lágrima de meus olhos. Tenho muita vergonha, sou muito tímido. Sou tão tímido que não consigo chorar sozinho. Escuto um barulho de uma bicicleta ergométrica. Alguém faz ginástica, quer emagrecer para o verão. Corpo perfeito. De que adianta? Vai virar tudo comida de verme mesmo. Mas as garotas gostam. Um cara malhado é motivo de suspiros. Quero que todas vão para o inferno! Não adianta nada, já estamos no inferno. E a culpa não é delas, é do sistema. Valoriza demais o corpo. Por isso elas não me dão bola.

É estranho o comportamento de certas mulheres. Quando tento ser engraçado, elas riem por pena, quando tento ser profundo, me ignoram. Estou sujo, ainda não tomei banho. E daí? Se tomo banho agora criaria mil expectativas e teria a certeza de mil desilusões. Ter expectativas é terrível, ainda mais comigo, que nem 0.000001% destas se concretizam. Que saco só me resta pensar. Mas pensar está me deixando louco. Por que eu não consigo viver como certas pessoas que vivem felizes, sem se importar com porra nenhuma? Tudo para mim toma proporções tão grandes que eu não consigo viver sem estar em permanente estado de paranóia.

Para certas pessoas tudo é tão simples. Só contam histórias, inventam vitórias, bebem, tocam violão, cantam, fumam maconha, vivem sem se preocupar com suas insignificâncias. Sem se preocupar que daqui pouco o que fazem completará uma hora de vida e daqui a três anos talvez nem se lembrem o que faziam. Pense bem, quem se lembrará de nós no ano 3457, no dia três de abril às dezessete horas trinta e sete minutos, vinte e cinco segundos e quatorze milésimos? Quem? Tudo é muito insignificante. Queria de repente parar de viver, nunca ter existido, nunca ter deixado uma marca que seja. Ser um nada, nunca ter pensado, era isso o que eu queria.

Ah! Que tudo (e nada) se foda. A galera ta com um dez litros de vinho lá fora…

1 comentário Adicione o seu

  1. Maria de Fatima Morais Costa disse:

    Adorei este Monólogo! Parabéns 👏🌷

    Curtido por 2 pessoas

Deixe um comentário